Nota prévia

Em vez de contribuições da própria prática do ensino da língua de herança, a parte prática deste capítulo apresenta um projeto de investigação concreto sobre o ELH na Suíça de expressão alemã.


Ensino da língua de herança em foco. Os resultados do projeto de investigação «Desenvolvimento da primeira e segunda línguas em contexto intercultural»

Edina Krompàk

O ensino da língua de herança, ou, como é denominado na Suíça, o ensino da língua e cultura de origem (ELCO) situa-se no centro dos debates das políticas de educação. Por um lado, a Conferência Suíça dos Diretores Cantonais da Educação Pública (CDIP) explicitamente recomenda a oferta do ensino da LCO e possibilita o apoio financeiro no artigo 16 da Lei sobre as Línguas da Suíça, relativo à «promoção do conhecimento de outras línguas na sua primeira língua». Por outro lado, está sujeito a uma pressão institucional constante da primeira língua para a sua legitimação (Krompàk, 2014; ver também Reich, cap. 15 A). A principal pressão para a sua legitimação tem base no pressuposto de que a promoção da primeira língua favorece o desenvolvimento da segunda língua. A- trás desta suposição esconde-se a hipótese da interdependência de Cummins (1981), usada como ponto de partida para os estudos empíricos sobre os efeitos na primeira e segunda línguas.


Fundamentação teórica do projeto de investigação

O projeto de investigação «Desenvolvimento da primeira e segunda línguas em contexto intercultural» (Caprez – Krompàk, 2010) estabeleceu como objetivo, investigar os raramente estudados cursos de LCO (a partir daqui designados ELH), na Suíça de língua alemã, bem como adquirir conhecimento sobre o desenvolvimento linguístico das crianças com back-ground migratório. O foco do estudo incidiu sobre as seguintes questões: qual o efeito da frequência do ELH no desenvolvimento das competências linguísticas na primeira e segunda línguas? Quais as condições que caraterizam os cursos de LCO suíços? O estudo tem como referencial teórico o conhecimento sobre o insucesso escolar das crianças e adolescentes com background migratório, bem como a hipótese da interdependência de Cummins (1981). No essencial, esta refere-se à relação positiva entre o desenvolvimento da primeira e da segunda línguas. Na citação original são formuladas duas condições importantes da interdependência, a saber: o desenvolvimento equilibrado de ambas as línguas e a motivação adequada, o que dificulta a verificação empírica da hipótese. No contexto desta hipótese é afirmado que só se poderá alcançar um nível elevado na segunda língua, se a primeira língua for igualmente bem desenvolvida. Esta suposição é apoiada pela hipótese de nível limiar de Cummins (1984) adaptado*). A hipótese do nível limiar que o próprio autor mais tarde coloca criticamente em questão (Cummins, 2000), já não corresponde às conclusões da recente investigação sobre as línguas. Em contraste com a hipótese do nível limiar, o desenvolvimento linguístico não é considerado como um modelo de níveis, mas como um modelo que se desenvolve num processo dinâmico (Herdina & Jessner, 2000). Com o conceito de Translanguaging (GARCIA, 2009) também é colocado em destaque o desenvolvimento dinâmico das línguas e chama-se à atenção para o facto de nos indivíduos bilingues e multilingues não existirem limites claros entre cada uma das línguas.

  • *) Na hipótese do nível limiar de Cummins (1984) é assumido que o desenvolvimento da primeira e segunda línguas funciona em três níveis limiares. No nível mais baixo situa-se o Semilingua- lismus (semilingualismo), que corresponde a baixos níveis de competência linguística e leva a efeitos cognitivos negativos. O bilinguismo dominante, no qual uma das duas línguas é dominada num nível elevado, não apresenta nem efeitos positivos nem negativos. No bilinguismo aditivo trata-se de uma elevada competência linguística tanto na primeira como na segunda línguas. Este nível limiar superior tem efeitos positivos no desenvolvimento cognitivo (Caprez Krompàk, 2010).

Principais conclusões do estudo

Para obter uma imagem diferenciada do ensino da LCO (ELH), foi selecionado um desenho investigativo para o estudo, que tem em conta os diversos campos e níveis: nível do indivíduo, nível da família e nível da escola.

No nível do indivíduo, foram testados alunos de língua albanesa e língua turca do quarto e quinto anos escolares, tendo sido aplicado o teste-C na primeira e na segunda línguas em dois momentos. No primeiro momento de recolha de dados, o grupo de alunos com ELH era constituído por 126 alunos e o grupo de alunos sem ELH, por 55 alunos. No segundo momento de recolha de dados, participaram 80 crianças com ELH e 46 crianças sem ELH. As variáveis de controlo incluídas na análise foram: a motivação para a aprendizagem de línguas, o estatuto socioeconómico dos pais, a sua postura linguística e cultural, bem como o seu apoio à aprendizagem de línguas. A descoberta central do estudo longitudinal foi a de que a frequência do ELH, tendo em conta as variáveis de controlo, exercem uma influência positiva no desenvolvimento da primeira língua (albanês) (devido ao menor número de participantes no grupo de controle de crianças turcas sem ELH, a análise dos C-testes turcos não foi efetuada).

A frequência do ELH, bem como o apoio dos pais influenciam positivamente o desenvolvimento da língua albanesa nas pessoas investigadas. No desenvolvimento da segunda língua, o alemão, verificou-se um desenvolvimento paralelo dos dois grupos, uma vez que, nos dois momentos de recolha de dados, as crianças com ELH obtiveram resultados significativamente melhores do que as crianças sem ELH. No entanto, esta diferença não pôde ser explicada pelo efeito positivo do ELH. As variáveis de controlo, tais como o estatuto socioeconómico dos pais e a motivação não exerceram influência significativa no desenvolvimento das competências linguísticas em alemão. O desempenho em língua alemã no segundo momento de recolha de dados foi exclusivamente analisado em relação ao desempenho linguístico no primeiro momento da recolha de dados.

Em resumo, pode-se concluir que a promoção institucionalizada da primeira língua, mesmo que ocorra apenas uma vez por semana, exerce uma influência positiva sobre a primeira língua e não afeta o desenvolvimento da segunda língua. Os resultados mostram ainda um efeito tendencialmente positivo sobre as competências linguísticas gerais, que também beneficia a segunda língua (alemão).

No nível da família, e com base nos resultados da análise quantitativa de 111 questionários respondidos pelos pais, tornou-se claro que o apoio dos pais no desenvolvimento linguístico desempenha um papel importante, ainda que não decisivo. Verificou-se um padrão diferente na promoção da primeira língua: enquanto as mães comunicam claramente com os seus filhos mais frequentemente na primeira língua, o uso da língua entre pai e filho é caraterizado pela alternância de línguas (code-switching) (ver para este assunto também Schader 2006). A análise qualitativa do dados sublinhou a importância da atitude dos pais para a promoção da língua. Os pais cujos filhos frequentam o ELH enfatizam a importância de promover a primeira língua, o multilinguismo e a transmissão de conhecimento sobre o país de origem dos pais, bem como a integração na sociedade suíça.

No nível da escola, os principais resultados da análise quantitativa de questionários, respondidos por 338 professores do ELH na Suíça de expressão alemã, mostraram a falta de integração do ELH no ensino regular, e a daí decorrente rara colaboração existente como os professores suíços, bem como a incerteza em relação ao financiamento dos cursos do ELH. Por um lado, o financiamento destes cursos é assumido pelos pais, por outro lado, pelos consulados e embaixadas, e em alguns casos, pelos cantões e pela cidade (ver também cap. 1 A.3 neste volume). Deste modo, daqui resultam grandes diferenças de salário, bem como condições de trabalho precárias.

Outro resultado apontou para o défice de formação base e formação contínua dos professores do ELH (ver cap. 14). Embora a maioria dos entrevistados tenha completado o ensino superior no país de origem, apenas 50% têm uma formação para professor de línguas. A participação em programas de formação contínua é dificultada pelo financiamento (em muitos casos devem os próprios professores do ELH suportar os custos) e pelos horários de trabalho. No que respeita à promoção do bilinguismo, os resultados foram unilaterais: o objetivo principal dos professores do ELH inquiridos consiste exclusivamente na promoção da primeira língua e na transmissão de conhecimento do respetivo país de origem.


Conclusão

Em resumo, pode concluir-se que a hipótese da interdependência deu uma importante contribuição para a perceção diferenciada das competências linguísticas das crianças bilingues. No entanto, a hipótese não é adequada para a legitimação do ELH. Por um lado, a verificabilidade empírica da hipótese é dificultada pelas condições de formulação, por outro lado, a argumentação para a promoção da primeira língua deveria tomar uma direção diferente, que considere o multilinguismo individual e social como normalidade, reconhecendo-o e tratando-o em conformidade (também de forma independente em relação aos efeitos esperado na segunda língua), incentivando-o e valorizando-o.

Seria desejável que a promoção institucional das primeiras línguas através do ELH nas áreas da integração, bem como da formação base e formação contínua dos professores do ELH fosse desenvolvida e otimizada. Além disso, a questão do bilinguismo e multilinguismo ou Translanguaging (GARCIA, 2009) deveria desempenhar um papel importante na formação de professores, no que diz respeito à heterogeneidade. São necessários mais estudos sobre as diversas práticas linguísticas das crianças e dos jovens multilingues, tanto na família bem como nas instituições educativas. A diversidade linguística do século 21 poderia e deveria ser considerada nas medidas acima mencionadas, e a sua preseça no no sistema de ensino deveria e poderia ser um importante recurso, cada vez mais visível e vivido para todos os interessados.


Referências bibliográficas

Caprez-Krompàk, Edina (2010): Entwicklung der Erst- und Zweitsprache im interkulturellen Kontext. Eine empirische Untersuchung über den Einfluss des Unterrichts in heimatlicher Sprache und Kultur (HSK) auf die Sprachentwick- lung. Münster: Waxmann.

Caprez-Krompàk, Edina (2011): Was bringt der HSK-Unterricht für die Sprachentwicklung? vpod bildungspolitik, 174, p. 9–11.

Cummins, Jim (1981): The Role of Primary Language Development in Promoting Educational Success for Language Minority Students. In: California State Department of Education (ed.): Schooling and Language Minority Students: A Theoretical Framework. Los Angeles: Evaluation, Disseminati- on and Assessment Center, California State University, pp. 3–49.

Cummins, Jim (1984): Bilingualism and Special Education: Issues in Assessment and Pedagogy. Clevedon: Multilingual Matters.

Cummins, Jim (2000): Language, Power and Pedagogy. Bilingual Children in the Crossfire. Clevedon: Multilingual Matters.
Garcìa, Ofelia (2009): Bilingual Education in the 21th Century: A Global Perspective. West-Sussex: Wiley-Blackwell.

Herdina, Philip; Ulrike Jessner (2000): The Dynamics of Third Language Acquisition. In: Jasone Cenoz; Ulrike Jessner (eds.): English in Europe. The Acquisition of a Third Language. Clevedon: Multilingual Matters, p. 84–98.

Krompàk, Edina (2015): Herkunftssprachlicher Unter- richt. Ein Begriff im Wandel. In: Rudolf Leiprecht; Anja Steinbach (Hrsg.): Schule in der Migrations- gesellschaft. Ein Handbuch. Bd 2: Sprache – Rassismus – Professionalität. Schwalbach/Ts.: Wochenschauverlag, p. 64–83.

Schader, Basil (Hrsg.) (2006): Albanischsprachige Kinder und Jugendliche in der Schweiz. Hinter- gründe, sprach- und schulbezogene Unter- suchungen. Zürich: Verlag Pestalozzianum.


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