Selin Öndül, Rita Tuggener
1. Introdução
Quais os desafios com que se deparam os professores do ELH? A resposta detalhada mostra-se – conforme evidenciam as afirmações na parte 2 B – muito diversa e diferente entre os países de acolhimento, por exemplo em relação ao grau de integração do ELH no sistema de ensino regular. Por outro lado, também existem aspetos comuns e transversais. Os capítulos que se seguem focam nove destes aspetos; alguns já são conhecidos do capítulo 1A, outros serão aprofundados noutros capítulos. O objetivo desta secção é identificar os respetivos desafios, apoiar os professores a superá-los e sensibilizar estes para possíveis sobrecargas excessivas.
2. Condições de enquadramento, estruturas escolares
O ELH tem, na maioria dos países, cantões, estados federados e comunidades, o estatuto de uma oferta extracurricular com a frequência de duas horas a (raramente) quatro horas semanais. Conforme deta- lhadamente descrito no capítulo 1 A.3, é oferecido e organizado pelas instituições de ensino oficiais do pais de acolhimento, do consulado ou embaixada do país de origem ou de organizações não-governamentais (associações, fundações, …). Dependendo da instituição responsável, existem diferenças significativas ao nível das condições de contratação e dos vencimentos dos professores do ELH. Um estudo realizado na Suíça (Calderon, Fibbi, Truong, 2013) aponta para uma dis- crepância salarial que varia entre 0 a 100 francos suíços por aula. Dependendo da instituição responsável (e do número de aprendentes), existem professores a lecionar a tempo inteiro, parcial ou ainda voluntariamente.
Partindo dos instrumentos do enquadramento, das suas exigências e expetativas, o ELH tem de se orientar entre as normas vigentes do país de acolhimento, o programa curricular do país de origem e as diferentes expetativas (por exemplo das autoridades administrativas, dos colegas do ensino regular e dos encarregados de educação dos alunos, ver também cap. 1 A.2, objetivos do ELH, e a afirmação no cap. 2 B.2). Isto pode provocar diferentes conflitos, por exemplo quando alguns encarregados de educação mais tradicionais exigem «maior patriotismo», enquanto que o programa curricular do país de acolhimento enfatiza decididamente uma componente educativa que valoriza a cidadania, a tolerância e intercompreensão. O importante é que o professor defenda um ponto de vista claro e compatível com os instrumentos do enquadramento, e que o possa defender perante os seus colegas e encarregados de educação dos seus aprendentes.
De uma forma geral, o ELH decorre num horário extra-curricular, com pouca ligação ao ensino regular, distribuído por diferentes instituições escolares ou associações, por vezes em salas sem condições ou insuficientemente equipadas para a lecionação de aulas. Relativamente aos três primeiros aspetos, pouco ou nada um professor do ELH poderá fazer ou alterar. Contudo, para além de procurar uma conversa pessoal com o responsável de uma comunidade ou instituição de ensino, poderá ser interessante procurar o apoio de um sindicato ou grupo de apoio, no sentido de negociar as condições de enquadramento e de realização das aulas do ELH a um nível superior ou institucional.
As referidas «condições desfavoráveis de enqua- dramento» poderão levar a problemas de motivação, quer por parte dos alunos, quer por parte os professores. Para além das negociações e conversas mencionadas, uma estratégia para combater o baixo nível motivacional (nos alunos e nos professores) parece ser a realização de atividades emocionantes e interessantes no âmbito das aulas do ELH.
Se, além disso, for possível cooperar com escolas ou professores do ensino regular pelo menos de uma forma ocasional, fomenta-se não só a motivação, como também o desenvolvimento linguístico, social e psicológico dos alunos.
Diversos estímulos neste sentido são apresentados no cap. 12, como por exemplo a matriz para uma «carta de apresentação» com que os professores se possam apresentar antes do arranque das aulas. Ver também os «Conselhos para os novos alunos» muito concretos, de Valerie Bovina, no capítulo 1 B.5.
3. Preparação e apoio em relação às atividades dos professores do ELH
Os professores do ELH descobrem muito rapidamente as diferenças significativas entre o ELH e o ensino regular, para o qual a sua formação de base se destinou originalmente. As diferenças incluem, entre outros, a lecionação de vários níveis em simultâneo, heterogeneidade linguística acentuada nos alunos, a limitação da carga horária semanal, alunos habituados a métodos de ensino abertos e individualizados, materiais de ensino inadequados, baixo nível de integração no ensino regular, etc. (ver cap. 1 A.6 e 2 B.1).
De uma forma geral, os novos professores do ELH não se encontram preparados para as especificidades do ELH. Desta forma, necessitam de orientação e apoio através de informações e ações de formação complementar.
Um bom exemplo para este apoio representa a formação obrigatória «Introdução ao sistema educativo de Zurique» [Einführung in das Züricher Schulsystem], explicado no cap. 14 A.3. Contudo, depois desta primeira introdução num contexto local, torna-se muito importante familiarizar-se com os pontos principais da pedagogia, didática e metodologia em vigor no país de acolhimento, com as questões especificamente relacionadas com o planeamento das aulas do ELH e com as possibilidades de coordenação com o respetivo ensino regular. São necessárias várias ações de formação, por parte do país de origem e do de acolhimento, para cobrir este conjunto de aspetos (ver cap. 14). Adicionalmente, espera-se que o presente manual (sobretudo através dos estímulos para reflexão e discussão na parte C de cada capítulo) possa prestar um serviço valioso neste sentido. De qualquer das formas, torna-se imperativo cultivar contatos intensivos com colegas do próprio ELH, de outros ELH, do ensino regular, e com as autoridades locais e responsáveis institucionais do país de acolhimento.
4. Mediação cultural e transmissão enquanto novas facetas da missão profissional
Enquanto diretor de turma existe uma missão profissional clara, quer no país de origem, quer no de acolhimento. A maioria das competências necessárias para o desempenho destas tarefas é adquirida no âmbito da formação de base para professor. Quando um professor viaja para outro país, para exercer a sua profissão no âmbito do ELH, surge um conjunto de novas tarefas, para as quais não foi preparado formalmente. Entre estas encontram-se as funções de mediação e de transmissão multifacetadas entre os pais e os professores (ou outras instâncias) do país de acolhimento. Professores do ELH com bons conhecimentos da língua oficial do país irão confirmar o seguinte: muito rapidamente são solicitados enquanto tradutores durante as conversas com os pais. Isto poderá fazer muito sentido nas situações em que os alunos em questão são conhecidos por ambas as partes, quer dos professores do ensino regular, quer os do ELH. É evidente que a presença do professor do ELH neste caso ultrapassa largamente a de um simples tradutor. A propósito, parece-nos evidente que o professor do ELH solicitado deverá, nestes casos, ser remunerado para esta atividade complementar.
Mesmo quando os professores do ELH servem de tradutores em conversas com alunos que não sejam seus conhecidos, normalmente acabam por desempenhar uma função complementar de mediadores culturais e /ou intérpretes interculturais. Conhecendo, por um lado, o sistema local de ensino e suas expe- tativas, e, por outro, o background cultural da família, que também inclui as noções culturalmente específicas relativamente à educação e à escola, o professor do ELH pode estabelecer pontes preciosas, preencher lacunas de informação e apoiar deste modo, em simultâneo, ambas as partes presentes: o professor do país de acolhimento e os encarregados de educação.
Particularmente importante é a transmissão e tematização das normas e expetativas «invisíveis» (que não se encontram oficialmente escritas) presentes no país de acolhimento, normalmente desconhecidas das famílias migratórias provenientes de um território educativamente distante.
Estas normas «invisíveis» incluem regras consideradas obrigatórias e evidentes, como por exemplo a «hora certa» de ir para a cama para crianças de diferentes faixas etárias, a alimentação adequada das crianças, como lidar com trabalhos de casa e outras atividades em casa, etc. Obter estas informações e transmiti-las representa uma tarefa importante para os professores do ELH.
Quando o professor do ELH apresenta um conhecimento suficiente do sistema escolar local e destas «normas invisíveis», poderá organizar (possivelmente em cooperação com a escola local) sessões de esclarecimentos para encarregados de educação acerca dos valores, atitudes e expetativas da escola no país de acolhimento. Para concluir, parece-nos importante alertar para o facto do domínio de duas línguas não implica automaticamente a competência para desempenhar as tarefas de um tradutor. É fundamental gerir o desempenho das atividades exigentes da tradução intercultural de forma cuidadosa – para evitar cargas excessivas de trabalho.
5. Potencial e oportunidades do ELH
Among the pleasant challenges of the work as an HLT instructor is the fact that one becomes aware of the potential, the importance and the opportunities of this kind of education. In the following, we are going to limit the focus to four facets.
Uma parte significativa dos desafios mais agradáveis para os professores do ELH relaciona-se com o potencial, o significado e as oportunidades deste tipo de ensino. Limitar-nos-emos nesta secção a quatro aspetos.
a) Significado do ELH para o desenvolvimento da bilateralidade
O ELH fomenta fortemente o desenvolvimento das competências bilaterais (ler e escrever conforme língua primeira). O ELH representa praticamente a única forma para a aprendizagem e aquisição da língua de herança ao nível do conhecimento declarativo e da sua escrita estandardizada, bem como para o domínio bilingue, que englobe a competência da escrita nas duas línguas. Isto aplica-se sobretudo aos alunos pertencentes a famílias oriundas de países distantes e com pouco contato com a escrita, isto é, em que se fala um dialeto e não se escreve nem lê regularmente.
Através da escolarização das capacidades bilaterais no ELH, os aprendentes melhoram também as suas competências ao nível da sua língua materna. Deste modo, desenvolvem uma competência especial que representa uma parte integral da sua identidade bicultural. O ELH previne assim o risco destes aprendentes perderem a ligação à sua cultura escrita e se tornarem analfabetos na sua língua materna. Além disso, os alunos de background migratório costumam dominar um vocabulário, na sua língua materna, que se relaciona com temáticas do quotidiano e da vida familiar. No entanto, quando se trata de temáticas mais complexas ou textos mais exigentes, estes alunos sentem rapidamente as suas limitações lexicais.
O ELH desempenha, entre outras, a função importante de aumentar o vocabulário na língua materna e de o tornar funcional, tendo em conta conteúdos escolares e temáticas mais complexas.
Deste modo também se evita o desmembramento problemático do vocabulário que se costuma verificar: vocábulário relacionados com o quotidiano e a vida familiar é dominado essencialmente na língua materna, enquanto o vocabulário escolar e «académico» é dominado sobretudo na língua oficial do país.
Ambas as funções – desenvolvimento das competências bilaterais e de um vocabulário mais abrangente – deverão ser discutidas com os aprendentes e seus encarregados de educação, de forma a consciencializá-los para o seu significado.
b) Contributo para uma sociedade plurilingue
O ELH pode contribuir de forma significativa para a implementação de dois postulados das políticas linguísticas da União Europeia. O primeiro relaciona-se com a exigência para a aprendizagem precoce de, no mínimo, duas línguas estrangeiras. O segundo necessita da promoção do plurilinguismo individual, com o objetivo que cada indivíduo domine, no mínimo, mais duas línguas para além da sua língua materna (ver Europäische Union, 2005, nas referências bibliográficas). Uma condição imperativa para o cumprimento destas exigências prende-se, de facto, com a implementação de um enquadramento adequado para a realização do ELH por parte do sistema educativo regular, que informe os encarregados de educação sobre esta oferta e seus benefícios de forma séria e sustentável.
c) Potencial para a área da Language Awareness/Consciência Linguística
A educação plurilingue torna-se particularmente produtiva quando todas as línguas são promovidas em contexto escolar – isto é, em relação à leitura, escrita, o domínio da versão estandardizada, o desenvolvimento de um vocabulário abrangente e de uma consciência linguística.
Neste contexto, o ELH pode contribuir de forma muito significativa, sobretudo tendo em conta que este contributo não poderia ser promovido desta maneira pela escola regular. Deste modo, o ELH pode – desde que criadas ocasiões suficientes para a aprendizagem – promover fortemente o desenvolvimento do Language Awareness / da consiência linguística.
O domínio de, pelos menos, duas línguas desde o início (língua materna, língua oficial do país de acolhimento, eventualmente línguas estrangeiras escolares) podem e devem servir para criar diferentes oportunidades para a comparação entre e a observação das línguas no âmbito do ELH. Estas ocasiões de aprendizagem interessantes e emocionantes facilitam aos alunos a (inter)ligação das suas línguas.
Acrescem ainda os efeitos positivos largamente conhecidos e reconhecidos acerca do trabalho na área da Language Awareness / consiência linguística, que resultaram do facto de muitos alunos na Europa trabalharem com portefólios linguísticos. Entre um vasto catálogo destes efeitos definidos por James & Garrett (1992), selecionamos apenas alguns, que naturalmente também se aplicam a comparações entre e a observação das línguas no âmbito do ELH:
d) Benefícios para os professores do ELH
Desempenhar as funções de professor do ELH não só é desafiante como enriquecedor. As experiências variadas ao nível do trabalho pedagógico e o contato com a cultura do país de acolhimento oferecem uma oportunidade única para o desenvolvimento das competências interculturais próprias, por um lado, deixando-as influenciar o desempenho enquanto professor, por outro.
6. Um desafio particularmente especial: a própria integração no país de acolhimento
Professores do ELH que, contratualmente, desempe- nham a sua função num país de acolhimento durante um tempo determinado, precisam de se integrar durante esse tempo, ao passo que também têm de manter a sua capacidade de regressar ao seu país de origem. Esta realidade é exigente e pode significar a falta de possibilidade de se reunir com a família, da separação temporária do marido, da esposas e até dos filhos. Professores do ELH não costumam traba- lhar em equipa, para que que possa haver uma troca de impressões ou inter-ajuda diária. Pelo contrário, estes professores costumam trabalhar num horário extra-curricular e encontram-se frequentemente a viajar entre as diferentes escolas e apresentam, desta forma, um elevado grau de auto-responsabilização. Contatam com diferentes entidades responsáveis, têm de se orientar numa estrutura de normas e regulamentos vigentes enquanto levam a cabo a sua missão profissional. Adicionalmente, precisam de, após ter encontrado uma habitação, criar e manter uma rede de contatos pessoais e sociais. Bons conhecimentos da língua oficial do país de acolhimento, a capacidade de enfrentar riscos e desafios, a curiosidade, a persistência e o prazer no contato com outras pessoas representam, neste contexto, as condições prévias necessárias para conseguir uma integração bem sucedida, quer no contexto pessoal e social, quer no escolar e institucional. A falta de valorização ou consciencialização destes aspetos, fazendo-se dominar os incentivos económicos, pode ter como consequência o isolamento, o desgaste psicológico e doenças.
Aconselha-se, antes do início das novas funções, a aquisição do maior conhecimento possível relativamente ao país de acolhimento e às condições de trabalho enquanto professor do ELH – e a devida preparação. Particularmente importante é o domínio da língua do país de acolhimento (normalmente exige-se o nível B1 do Quadro de Referência Europeu) e uma ha- bitação inicial assegurada.
7. Heterogeneidade enquanto oportunidade e desafio
Uma caraterística das turmas atuais do ELH é a heterogeneidade ao nível do domínio linguístico, da biografia migratória e da idade. Responsáveis para esta realidade são fatores demográficos e (migratório-)históricos, entre outros. Já se referiu a heterogeneidade no capítulo 1 A.5, nesta secção iremos acentuar e aprofundar três dos pontos anteriormente mencionados.
a) Heterogeneidade linguística
O ELH era, na sua forma original, orientado para o regresso dos alunos, visando a sua integração no sistema escolar do país de origem. Nessa altura, o ELH era frequentado maioritariamente pelos filhos de trabalhadores, cuja estadia se previa como sendo temporária. Os backgrounds familiares e níveis linguísticos eram mais ou menos homogéneos. Esta realidade mudou completamente nos dias de hoje. Assim, existem crianças italianas ou croatas na terceira geração migratória a frequentar o ELH, bem como crianças recém-chegadas ao país de acolhimento. Adicionalmente, surgem cada vez mais crianças de famílias «mistas», isto é, em que apenas um dos encarregados de educação domina a língua de herança e que, por consequência, apresentam níveis de domínio linguís- tico significativamente menores do que as restantes crianças.
A expressão «língua materna» em si torna-se conflituosa para algumas destas crianças ou adolescentes – seja por terem crescido no contato com duas línguas ou por terem desenvolvido competências na língua oficial do país de acolhimento muito superiores às da língua de herança.
O facto destes alunos não utilizarem a sua língua materna nas conversas entre si durante os intervalos das aulas, mas a língua oficial do país de acolhimento, não representa, pelos motivos anteriormente referidos, exceção alguma.
b) Heterogeneidade etária
As turmas do ELH são, na sua maioria, compostas por alunos de diferentes idades; nos casos extremos uma mesma turma engloba aprendentes do pré-primário ao nono ano. Isto torna-se particularmente exigente tendo em conta o facto da faixa etária não corresponder obrigatoriamente a um determinado nível linguístico, conforme referido anteriormente (um aluno comunicativo e aplicado do terceiro ano pode ser mais proficiente do que um aluno do oitavo ano que apenas utiliza a língua de herança na comunicação com a sua mãe em casa). Uma turma com alunos de idades mistas pode ter a vantagem de possibilitar a aprendizagem entre os alunos das diferentes faixas etárias. Contudo, também pode apresentar problemas quando o intervalo de idades é demasiado vasto, de forma a impossibilitar interesses ou conteúdos temáticos comuns. Nestes casos, depende da criatividade didática do professor do ELH. O intercâmbio de ideias e experiências com colegas do ELH e a preparação conjunta das atividades podem representar um apoio valioso; os capítulos 9–12 do presente manual incluem orientações adicionais neste sentido.
c) Backgrounds familiares
Uma outra dimensão da heterogeneidade relaciona-se com o background educacional e condições de vida das famílias. Apesar de serem provenientes do mesmo país de origem, é possível identificar diferenças, por vezes significativas, no que diz respeito ao nível de formação, estatuto social e situações de vida das famílias. Esta realidade explica-se através das diferentes motivações económicas e políticas nas diferentes classes sociais que estão na origem do movimento migratório. Os diferentes backgrounds socioculturais dos aprendentes – em conjunto com as diferenças etárias e linguísticas – podem tornar-se desafios muito grandes para os professores do ELH; por outro lado, também podem representar objeto interessante e enriquecedor para a reflexão e discussão conjunta.
Um dos pontos comuns entre todos os alunos do ELH é o seu bi- ou plurilinguismo, incluindo os recursos e potenciais que estes implicam. Por isso aconselha-se aos professores que trabalham com este tipo de aprendentes o aprofundamento dos seus conhecimentos acerca do bi- e plurilinguismo.
Um primeiro entendimento importante nesta matéria é que o bilinguismo não significa o perfeito domínio (ao nível da escrita ou da oralidade) de duas línguas. De uma forma geral, os aprendentes encontram-se em níveis de competência diferentes nas suas línguas; isto é normal e representa o ponto de arranque para a sua promoção linguística. De importância particular é o reconhecimento do seu desempenho e das suas competências – particularmente das competências na sua língua materna, que costuma ser pouco valorizada e apreciada pela sociedade e pela escola regular.
Aconselha-se vivamente a obra «The Psycholinguistics of Bilingualism» de Grosjean & Li (2013) (que infelizmente só está disponível na sua versão inglesa). Esta obra transmite bases facilmente compreensíveis e apoia os professores do ELH relativamente ao seu desenvolvimento, às conversas com os encarregados de educação e com outras pessoas desconhecedoras do ELH, ou céticas em relação ao ELH e da temática do bilinguismo.
8. Materiais de ensino e trabalhos de casa
a) Materiais de ensino
Um dos desafios com que os professores do ELH se deparam frequentemente é a situação insatisfatória relacionada com os manuais e outros materiais específicos para o ELH (ver cap. 1 A.6 e 2 B.2). O capítulo 10 A.4 dedica-se particularmente a este assunto («Possíveis fontes para materiais de ensino»), onde também se encontra (tal como no cap. 10 A.5 e .6) uma série de conselhos concretos e praticáveis para a aquisição de materiais.
Um investimento inquestionavelmente rentável neste contexto é o intercâmbio regular de ideias, materiais e fontes (eletrónicas e outras) com colegas do ELH. Muitos professores dispõem de um vasto conjunto de materiais auto-produzidos. A troca destes materiais ou a implementação de um arquivo comum (eventualmente em formato digital) pode representar uma ajuda valiosa para facilitar o trabalho de todos.
b) Trabalhos de casa
De uma forma geral, os trabalhos de casa representam um complemento sensato às aulas do ELH, sobretudo tendo em conta o número limitado de lições durante o ano letivo. Contudo, verificam-se algumas diferenças no tratamento com trabalhos de casa entre os países – de forma a ser necessário orientar-se no sistema local de ensino regular. Igualmente devem ser levados em consideração as restantes atividades e compromissos das crianças nos seus tempos livres.
Quando os trabalhos de casa representam uma carga excessiva para os alunos, haverá uma certa tendência de abandonar o ELH. Se, pelo contrá- rio, os trabalhos de casa representam um complemento sensato e exequível no contexto das aulas regulares do ELH, irão apoiar o processo de aprendizagem, usufruindo também da ajuda dos encarregados de educação.
A qualidade dos trabalhos de casa é, no mínimo, tão importante quanto a sua quantidade: os alunos estão dispostos a dedicar o seu tempo com deveres interessantes e emocionantes; já para um exercício monótono e obrigatório nem 20 minutos querem despender.
9. Avaliação das competências e do desempenho dos alunos
Na gestão de uma turma fortemente heterogénea, a definição de objetivos, conteúdos e exigências individualizados pode representar uma possibilidade importante para oferecer um ensino de qualidade (ver também cap. 3 em relação às caraterísticas de um ensino de qualidade). Contudo, a individualização implica também questões e desafios relacionados com a avaliação do desempenho. O capítulo 7 («Avaliar o desempenho de forma a promover o seu desenvolvimento») debruça-se sobre aspetos centrais nesta matéria; a parte 7 B apresenta exemplos práticos que podem dar estímulos interessantes. Ainda assim, a avaliação dos alunos que faça justiça às diferentes competências dos aprendentes permanece uma tarefa praticamente impossível face à heterogeneidade das turmas e do tempo reduzido disponível.
Igualmente exigente é a gestão das diferentes expetativas em relação às notas de aproveitamento do ELH, quer por parte dos encarregados de educação, quer por parte dos professores do ensino regular: os professores locais gostam de ter notas preferencialmente «realistas» que permitem estabelecer certas conclusões quanto à competência na língua materna e à atitude face ao trabalho nos alunos. Os encarregados de educação preferem notas boas. Más notas podem levar à anulação da matrícula, o que é sempre possível tendo em conta o caráter facultativo deste tipo de ensino. Uma solução para este dilema é desafiante; a forma mais sensata de chegar a um resultado satisfatório parece-nos a conversa com ambas as partes (encarregados de educação e professores regulares). Um dos problemas neste cenário poderá ser o elevado grau de exigência temporal que estas atividades implicam. Neste caso é aconselhável reduzir estas conversas a um número limitado de alunos, que apresentem caraterísticas especiais ou outros motivos (por exemplo a sua chegada recente) que apontem para a necessidade de comunicar com outros agentes comunicativos.
A avaliação dos alunos do ELH implica um forte potencial de sobrecarga excessiva que não pode ser subestimado.
Aconselhamos a enfrentar este assunto com seriedade e a discuti-lo com as autoridades escolares locais. No sentido de promover uma orientação dos alunos relativamente ao desenvolvimento da sua auto-avaliação, fornecendo-lhes um conjunto de critérios compreensíveis para eles aconselha-se ainda a elaboração de um feedback, transmitido de forma escrita ou oral, para além da simples definição da nota quantitativa.
10. Direção e disciplina: gestão dos comportamentos dos alunos
As tarefas da escola incluem o desenvolvimento de competências específicas, bem como a transmissão de valores e de competências sociais (correspondendo à dupla missão da escola pública enquanto instituição para a educação e cidadania). No entanto, quanto a este assunto, reinam ideias e prioridades muito diferentes entre os países. Assim, é possível haver uma forte valorização da autonomia num determinado país, noutro o foco poderá assentar sobre a disciplina, o rigor e a pontualidade enquanto competências centrais, e um terceiro poderá ainda colocar a democracia no centro da sua educação para a cidadania (compare também capítulos 4 e 5, que reúnem os aspetos centrais sobre os principais consensos nos países da Europa do Norte e Europa Ocidental).
As diferenças mencionadas, que também podem existir de professor para professor, exercem uma influência sobre a gestão da turma e a concretização das normas e regras da turma. Os alunos conhecem a forma de direção das turma no país de acolhimento e consideram-na enquanto a norma ou normal. Contudo, esta forma da direção das turmas poderá distinguir-se significativamente da forma de o fazer no âmbito do ELH. O importante é conhecer as diferenças e a implementação de um sistema próprio de regras que tenha sido discutido com os alunos.
É frequente haver relatos, por parte dos professores do ELH, em relação a «problemas de disciplina», pelo facto de haver, por um lado, grandes diferenças entre a sua direção da turma, incluindo os seus rituais, e os que os alunos estão habituados a seguir no ensino regular, e, por outro, pela existência de expetativas distintas entre si, que alunos e professores constroem em relação ao Outro.
Aconselhamos aos professores do ELH conhecer os rituais escolares locais, através de visitas às escolas, conversas sobre os modelos locais de comportamento, sobre a distribuição de papéis (alunos e professores) e sobre rituais do quotidiano. Com base nesse conhecimento, os professores do ELH poderão, de forma assertiva e autêntica, criar as suas próprias regras de conduta em sala de aula. Estas podem relacionar-se com os valores, princípios e normas de ambas as culturas em contato, isto é, com os do país de aco- lhimento e com os do país de origem. Quando estas regras são discutidas e implementadas em conjunto com os alunos – incluindo as consequências do seu incumprimento – recebem maior respeito e aceitação.
Referências bibliográficas
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oder http://eur-lex.europa.eu/legal-content/DE/ TXT/?uri=CELEX:52005DC0596
Grosjean, François; Ping Li (2013): The Psycholingu – istics of Bilingualism. Malden, MA, & Oxford: Wiley-Blackwell.
James, Carl; Peter Garett (1992): The Scope of Lan- guage Awareness. In: C. James and P. Garett (eds.): Language Awareness in the Classroom. London: Longman, S. 3–20.
Schader, Basil; Nexhat Maloku (2015): Förderung des Schreibens in der Erstsprache (= Série «Materiais para o ensino da língua de herança»; sugestões didáticas 1).
vpod Bildungspolitik (2014): Sonderheft Nr. 188/189 «Die Zukunft des Erstsprachunterrichts» (diferen- tes contributos).